24 de ago. de 2010

Tudo escuro.
Escuta-se o quebrar espantoso de um copo.
Escuta-se o andar circular de uma pessoa com sapatos sociais sobre vidro quebrado.
Escuta-se o cair de gotas de um líquido.
Revela-se que, sob luz de velas, as gotas são de sangue.
Revela-se, em outro plano, um par de mãos atadas à uma cadeira por um terço católico.
Revela-se, ainda no mesmo plano, o homem que circula a cadeira.

Se configura uma tensão, tanto pelos ruidos como também por toda situação de repressão causada pelas imagens.
A cada passo, uma ferida surge no braço daquele que está preso.

O homem, de calça social preta que circula a cadeira e o atado dá o texto:

"Superprotege nesse égo inflado e se cerca quando diz que a sociedade te limita, esquecendo que aqui dentro, sozinho, a sociedade é você"
"Tá sentindo? Você deixa de fazer por fazer o que faz."
"Como a gente foi chegar nisso?"
"É isso que estamos sempre tentando responder"
"Ei... Presta Atenção"
"As coincidências externas mostra quem é. O que você é."
"E se dar conta deste momento faz valer o outro tempo que passou perdido"
"Isso aí, essa coisa... É o que acha ou o que quer que achem de você?"
"Deixa eu te apresentar o teu inimigo imaginário"
Voz de criança: "Oi, meu nome é João"
Cai a placa "Dr. João Ninguém"
"A maioria é massa ambulante"
"Me diz, o que é o dever de submeter-se às regras que não escolheu?"
"Como dizes: Pode ser careta. Mas fazemos divertido."
"Essa descoberta e esse que te fala agora... Eles te vêem."
"E eles querem uma resposta..."
"Nem que seja o conformar da sua mediocridade burocrata."
"Mas se estamos aqui, que decida ser o herói de sí."
"Que seja o protagonista do teu próprio romance."
"Do contrário, esse som é o espelho da tua imagem, quebrado."
"Do contrário, nega a sí e se complica: criando e fatasiando os axiomas que no cerne - no âmago da essência - são simples."
"As pessoas só choram de verdade por causa do cheiro de uma cebola qualquer..."


No decorrer dessas frases peças e artigos que fazem parte da rotina de um trabalhador de gênero feminino e/ou masculino caem no chão e/ou se desmaterializam... como um contrato que se esvai pegando fogo numa velocidade extrema... pedaços de gravata caem sobre o chão, vidro de esmalte para unhas se quebra, sapato feminino cai no chão de forma que não fique em pé... uma plaqueta de mesa escrito: "Dr. José Ninguém" cai e se quebra... Entre outros.

Também no decorrer das frases, sons como: Faca sendo amolada, cebola sendo cortada, faca picando a cebola, grito e gargalhar de criança, barulho de pressão no ouvido, zíper, campaínha, bater de um prego na madeira... entre outros. (sem mencionar o cíclico barulho de gotas e os passos sobre o vidro).

o filme termina com a frase: "...As pessoas só choram de verdade por causa do cheiro de uma cebola qualquer..."
Revela-se uma cozinha comum americana
Um homem picando cebolas
Uma criança chega pisando sobre o vidro do copo quebrado
O barulho da criança tira a atenção do homem que, após olhar a criança, tem o insight de que quem estava atado na cadeira dentro do seu pensamento era na verdade a criança dele mesmo que ele aprisionou. Colocando a culpa na sociedade e no sistema economico regente, nas regras e convenções de convivência da vida humana, na propaganda, na TV, na religião.
Quando na verdade ele, é o opressor e burocrata de sí. O artista que virou advogado, médico.

É isso que o filme retrata: O Artista que se deu conta que fugiu - por conta própria - do dever de abrir os olhos dos outros, fazer os outros pensar. E colocou a culpa no sistema social atual, na TV, na burocracia de ser artista. Colocou a culpa no fardo de pensar.

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